Este domingo foi dia de romaria a Sintra. Desta vez não para correr nos trilhos da Serra, mas para participar em mais um Grande Prémio Fim da Europa. Foi apenas a minha segunda participação na prova, depois de 2 ou 3 anos me ter atrasado nas inscrições e daquele ano em que a prova não se realizou (pelo menos oficialmente). Este ano o Grande Prémio, que entretanto passou a mísera Corrida, foi brindado com um dia perfeito de primavera. Céu limpo, temperaturas não demasiado baixas e pouco vento.
Apesar de ter sido apenas a primeira, a minha participação do ano passado foi o suficiente para colocar esta corrida no top 3 das minhas preferências em corridas de estrada. Curiosamente, ou nem por isso, foi muito pouco tempo depois de a correr que tomei a decisão de fazer este blog.
O Fim da Europa é uma corrida diferente, tanto pela localização como pelo percurso. Nada ali é monótono ou maçador, tudo é desafiante. E os desafios começam logo pela logística da prova. Sendo ela linear (começa em Sintra e acaba no Cabo da Roca, 16.6km depois), a questão dos transportes pode ser uma grande complicação. Felizmente a organização disponibilizou um sistema de transportes colectivos. Dizem às más línguas que é muito complexo e que um dos pré-requisitos para a inscrição na prova deveria ser um grau de mestrado, para o conseguir perceber. Felizmente existe este esquema simplificado, feito pelo João Campos, que a meu ver deveria fazer parte do kit de entrega com o dorsal:
Como não encontrei este verdadeiro manual de sobrevivência antes da fazer a inscrição, decidi não pagar pela utilização dos autocarros, mas antes desenvolver o meu próprio esquema de logística. Passo então a descrever:
Os atletas A, B e C, arrancaram no carro X para se encontrarem com o atleta D (que estava no carro Y) e os atletas E e F (no carro W). O atleta C passou então para o carro W e foram nos carros X, W e Y ao encontro do atleta G que estava no carro Z à nossa espera na Azóia. Quando lá chegados, o atleta G juntou-se ao carro X e os atletas E e F, juntaram-se a C e D no carro W, e foram para Sintra, deixando os carros Y e Z na Azóia. No fim da prova, todos os atletas percorrem a pé a distancia entre o Cabo da Roca e Azóia para entrarem no carro Z (atletas A, B, G) e no carro Y (C, D, E F) em direcção a Sintra. Lá chegados, retomaram as posições iniciais e rumaram a casa. Simples!
Ora bem, como qualquer máquina oleada, esta logística permitiu-nos chegar exactamente em cima da hora de partida a Sintra. Quase que consigo ouvir as más línguas de que falava lá atrás a dizer que devíamos ter chegado antes, para fazer um aquecimento, fazer um xixi, relaxar, bla bla bla... Sabem lá eles! A partida era às 10:15, 10h10 é uma hora perfeitamente aceitável para chegar à recta da meta, e só tivemos que correr metade do caminho do carro atá lá, o resto foi só em passo acelerado!
'Tá giro.. Mas eu vou só daqui a um quarto de hora, se não se importam. |
Como já perceberam, só parti às 10:15, na segunda vaga de partida. Porquê? Perguntam vocês. Perguntam bem, mas não vos sei responder. Já dei voltas e voltas e não me lembro porque tive a ideia de me inscrever na segunda vaga. Esta segunda vaga de partida foi criada pela organização para diminuir o congestionamento do percurso naqueles primeiros quilómetros a subir. A ideia de fazer partidas diferenciadas parece-me lógica, mas sendo o critério apenas decidir se quer partir às 10 ou 10:15, a grande maioria preferiu partir às 10 restando pouca gente para a segunda vaga. Talvez seja boa ideia organizar as partidas por currais de tempos, como é habitual. Como estava pouca gente, consegui posicionar-me logo por baixo do pórtico e arrancar a bom ritmo.
Como sempre, não faço aquecimento antes das provas. A menos que ficar especado de braços cruzados a olhar para o relógio de 30 em 30 segundos conte como aquecimento. Percebo logo que os prós foram todos às 10, porque rapidamente me vejo no grupo dos 4 ou 5 mais rápidos desta segunda vaga. Ainda longe de estabilizar o ritmo e a respiração, foi a arfar e com os pulmões a sair pela boca que percorri aqueles primeiros 4km, quase sempre a subir.
Não há muitas provas de estrada que faça sentido por aqui o perfil, mas esta é uma delas. |
Tenho que confessar que conhecer o percurso desta corrida é uma grande vantagem. Sabia que depois destes 4km iniciais podia forçar o ritmo até apanhar a parede dos 10km, antes da grande descida, e foi isso que fiz. Por volta dos 4km comecei a apanhar o pelotão que partiu às 10, e começou o zigue-zague. No entanto não foi um grande constrangimento, já ia bastante disperso o que facilitou as ultrapassagens, quase nunca tive que abrandar e foram raras as mudanças rápidas de direcção. Por outro lado teve a vantagem de ir passando e cumprimentado alguns conhecidos! Foi nesta altura que consegui começar a correr com conforto. Atacava as subidas tentando não abrandar (sabia do ano passado que estas nunca seriam muito longas) e acelerava nas descidas. Seguia completamente focado na estrada, no ritmo e nas ultrapassagens, não deixando espaço para a contemplação dos sítios maravilhosos por onde passámos. Pensei nisso quando ao passar num abastecimento alguém disse "olhem para o mar!!", nessa altura levantei a cabeça e vi o sitio brutal onde estávamos. Dá que pensar, e fez-me ficar com saudades dos trilhos.
Como já disse noutros posts, apesar de gostar cada vez mais de trail, há coisas que a estrada oferece que os trilhos nunca vão chegar perto. É verdade, se fosse um trail teria parado para ver a paisagem, ia mais devagar, descontraído... Mas nada paga aquela adrenalina de a meio da parede dos 10km, a correr quase de nariz no chão, com batimentos cardíacos a 200, respiração ofegante e pensar "vá láaa, puxa só mais um pouco!!!", até que fazemos a curva e vemos o topo da subida! Era altura de alargar a passada e dar cabo das pernas por ali abaixo! Seriam 6km a descer a pique, sentir os músculos das pernas a tremer a cada passada, tentar correr mais depressa e perceber que é fisicamente impossível, era a forçar até ao Fim da Europa!!!!! .....mas não sem antes parar para fazer um xixizinho...
Como sempre, a descida foi brutal. Enquanto corria tinha a perfeita noção que amanhã pagaria o preço por aquela tareia que estava a dar aos músculos, mas era tarde de mais para pensar nisso. Tinha agora passado a Azóia, estava na recta da meta e era só curvar à esquerda antes do farol! Opsss, afinal não, a organização decidiu prolongar o percurso mais 300 metros, o que incluía uma subida gigantesca, maior que as outras todas juntas, e uma descida violentíssima num terreno super técnico!!! Ok, na verdade era só um sobe e desce pequeno, MAS não estava à espera daquilo!
A chegar à meta. Conseguem ver lá atrás a BRUTAL descida. |
Terminei com o tempo de 1h11, três minutos mais rápido que o ano passado, o que me deixou muito satisfeito já que na altura andava a treinar para a maratona de Sevilha e estava muito perto da minha melhor forma. Nunca falei aqui no blog de classificações, porque muito sinceramente não me importo rigorosamente nada com elas, apesar de gostar de ver em que parte do pelotão é que me situei. Mas fiquei orgulhoso do 61º lugar em 2300 finishers! Acordei no dia seguinte com dores nos gémeos e o resto das pernas doridas. A uma semana dos Abutres pode ser problemático. Logo se vê...
Quanto à prova, mais uma vez correspondeu às expectativas. Um percurso super desafiante, nada monótono e muito divertido. Os abastecimento (dois) pareceram-me bem posicionados, apesar de não ter bebido água em nenhum deles (focado na estrada, no ritmo, etc etc, lembram-se?), os snacks no fim da prova, juntamente com o chá quente, já são um clássico e para mim muito bem vindos! Só tenho pena de mais uma vez não ter havido medalha. Sim, eu sei que estão cheios de lata nas gavetas e que não se interessam nada por isso, mas eu cá gosto de as receber e guardar.
Espera-me agora uma semana descontraída (a primeira em muito tempo), a descer até à Serra da Lousã. Vamos lá ver então esses famosos Abutres.