As minhas corridas na estrada

terça-feira, 27 de janeiro de 2015

Até ao Fim da Europa (e mais 300 metros)!!

Este domingo foi dia de romaria a Sintra. Desta vez não para correr nos trilhos da Serra, mas para participar em mais um Grande Prémio Fim da Europa. Foi apenas a minha segunda participação na prova, depois de 2 ou 3 anos me ter atrasado nas inscrições e daquele ano em que a prova não se realizou (pelo menos oficialmente). Este ano o Grande Prémio, que entretanto passou a mísera Corrida, foi brindado com um dia perfeito de primavera. Céu limpo, temperaturas não demasiado baixas e pouco vento. 


Apesar de ter sido apenas a primeira, a minha participação do ano passado foi o suficiente para colocar esta corrida no top 3 das minhas preferências em corridas de estrada. Curiosamente, ou nem por isso, foi muito pouco tempo depois de a correr que tomei a decisão de fazer este blog. 

O Fim da Europa é uma corrida diferente, tanto pela localização como pelo percurso. Nada ali é monótono ou maçador, tudo é desafiante. E os desafios começam logo pela logística da prova. Sendo ela linear (começa em Sintra e acaba no Cabo da Roca, 16.6km depois), a questão dos transportes pode ser uma grande complicação. Felizmente a organização disponibilizou um sistema de transportes colectivos. Dizem às más línguas que é muito complexo e que um dos pré-requisitos para a inscrição na prova deveria ser um grau de mestrado, para o conseguir perceber. Felizmente existe este esquema simplificado, feito pelo João Campos, que a meu ver deveria fazer parte do kit de entrega com o dorsal:


Como não encontrei este verdadeiro manual de sobrevivência antes da fazer a inscrição, decidi não pagar pela utilização dos autocarros, mas antes desenvolver o meu próprio esquema de logística. Passo então a descrever:

Os atletas A, B e C, arrancaram no carro X para se encontrarem com o atleta D (que estava no carro Y) e os atletas E e F (no carro W). O atleta C passou então para o carro W e foram nos carros X, W e Y ao encontro do atleta G que estava no carro Z à nossa espera na Azóia. Quando lá chegados, o atleta G juntou-se ao carro X e os atletas E e F, juntaram-se a C e D no carro W, e foram para Sintra, deixando os carros Y e Z na Azóia. No fim da prova, todos os atletas percorrem a pé a distancia entre o Cabo da Roca e Azóia para entrarem no carro Z (atletas A, B, G) e no carro Y (C, D, E F) em direcção a Sintra. Lá chegados, retomaram as posições iniciais e rumaram a casa. Simples!

Ora bem, como qualquer máquina oleada, esta logística permitiu-nos chegar exactamente em cima da hora de partida a Sintra. Quase que consigo ouvir as más línguas de que falava lá atrás a dizer que devíamos ter chegado antes, para fazer um aquecimento, fazer um xixi, relaxar, bla bla bla... Sabem lá eles! A partida era às 10:15, 10h10 é uma hora perfeitamente aceitável para chegar à recta da meta, e só tivemos que correr metade do caminho do carro atá lá, o resto foi só em passo acelerado! 

'Tá giro.. Mas eu vou só daqui a um quarto de hora, se não se importam.
Como já perceberam, só parti às 10:15, na segunda vaga de partida. Porquê? Perguntam vocês. Perguntam bem, mas não vos sei responder. Já dei voltas e voltas e não me lembro porque tive a ideia de me inscrever na segunda vaga. Esta segunda vaga de partida foi criada pela organização para diminuir o congestionamento do percurso naqueles primeiros quilómetros a subir. A ideia de fazer partidas diferenciadas parece-me lógica, mas sendo o critério apenas decidir se quer partir às 10 ou 10:15, a grande maioria preferiu partir às 10 restando pouca gente para a segunda vaga. Talvez seja boa ideia organizar as partidas por currais de tempos, como é habitual. Como estava pouca gente, consegui posicionar-me logo por baixo do pórtico e arrancar a bom ritmo.

Como sempre, não faço aquecimento antes das provas. A menos que ficar especado de braços cruzados a olhar para o relógio de 30 em 30 segundos conte como aquecimento. Percebo logo que os prós foram todos às 10, porque rapidamente me vejo no grupo dos 4 ou 5 mais rápidos desta segunda vaga. Ainda longe de estabilizar o ritmo e a respiração, foi a arfar e com os pulmões a sair pela boca que percorri aqueles primeiros 4km, quase sempre a subir. 

Não há muitas provas de estrada que faça sentido por aqui o perfil, mas esta é uma delas.
Tenho que confessar que conhecer o percurso desta corrida é uma grande vantagem. Sabia que depois destes 4km iniciais podia forçar o ritmo até apanhar a parede dos 10km, antes da grande descida, e foi isso que fiz. Por volta dos 4km comecei a apanhar o pelotão que partiu às 10, e começou o zigue-zague. No entanto não foi um grande constrangimento, já ia bastante disperso o que facilitou as ultrapassagens, quase nunca tive que abrandar e foram raras as mudanças rápidas de direcção. Por outro lado teve a vantagem de ir passando e cumprimentado alguns conhecidos! Foi nesta altura que consegui começar a correr com conforto. Atacava as subidas tentando não abrandar (sabia do ano passado que estas nunca seriam muito longas) e acelerava nas descidas. Seguia completamente focado na estrada, no ritmo e nas ultrapassagens, não deixando espaço para a contemplação dos sítios maravilhosos por onde passámos. Pensei nisso quando ao passar num abastecimento alguém disse "olhem para o mar!!", nessa altura levantei a cabeça e vi o sitio brutal onde estávamos. Dá que pensar, e fez-me ficar com saudades dos trilhos. 

Como já disse noutros posts, apesar de gostar cada vez mais de trail, há coisas que a estrada oferece que os trilhos nunca vão chegar perto. É verdade, se fosse um trail teria parado para ver a paisagem, ia mais devagar, descontraído... Mas nada paga aquela adrenalina de a meio da parede dos 10km, a correr quase de nariz no chão, com batimentos cardíacos a 200, respiração ofegante e pensar "vá láaa, puxa só mais um pouco!!!", até que fazemos a curva e vemos o topo da subida! Era altura de alargar a passada e dar cabo das pernas por ali abaixo! Seriam 6km a descer a pique, sentir os músculos das pernas a tremer a cada passada, tentar correr mais depressa e perceber que é fisicamente impossível, era a forçar até ao Fim da Europa!!!!! .....mas não sem antes parar para fazer um xixizinho...

Como sempre, a descida foi brutal. Enquanto corria tinha a perfeita noção que amanhã pagaria o preço por aquela tareia que estava a dar aos músculos, mas era tarde de mais para pensar nisso. Tinha agora passado a Azóia, estava na recta da meta e era só curvar à esquerda antes do farol! Opsss, afinal não, a organização decidiu prolongar o percurso mais 300 metros, o que incluía uma subida gigantesca, maior que as outras todas juntas, e uma descida violentíssima num terreno super técnico!!! Ok, na verdade era só um sobe e desce pequeno, MAS não estava à espera daquilo!

A chegar à meta. Conseguem ver lá atrás a BRUTAL descida.
Terminei com o tempo de 1h11, três minutos mais rápido que o ano passado, o que me deixou muito satisfeito já que na altura andava a treinar para a maratona de Sevilha e estava muito perto da minha melhor forma. Nunca falei aqui no blog de classificações, porque muito sinceramente não me importo rigorosamente nada com elas, apesar de gostar de ver em que parte do pelotão é que me situei. Mas fiquei orgulhoso do 61º lugar em 2300 finishers! Acordei no dia seguinte com dores nos gémeos e o resto das pernas doridas. A uma semana dos Abutres pode ser problemático. Logo se vê...

Quanto à prova, mais uma vez correspondeu às expectativas. Um percurso super desafiante, nada monótono e muito divertido. Os abastecimento (dois) pareceram-me bem posicionados, apesar de não ter bebido água em nenhum deles (focado na estrada, no ritmo, etc etc, lembram-se?), os snacks no fim da prova, juntamente com o chá quente, já são um clássico e para mim muito bem vindos! Só tenho pena de mais uma vez não ter havido medalha. Sim, eu sei que estão cheios de lata nas gavetas e que não se interessam nada por isso, mas eu cá gosto de as receber e guardar. 

Espera-me agora uma semana descontraída (a primeira em muito tempo), a descer até à Serra da Lousã. Vamos lá ver então esses famosos Abutres.


segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Agora? Agora aguenta-te!

Foi assim a minha semana de recuperação dos 47km de Proença a Nova:

A certa altura pensei "elah, não achas que estás a exagerar? Ainda faltam 3 meses para o MIUT!".

Depois li isto:

"Passados pouco mais de 20km de prova e depois de já termos enfrentado uma outra subida até acima dos 1.000m de altitude, enfrentávamos agora a subida que vai de Chão da Ribeira até Estanquinhos. Embora ainda estivéssemos "frescos", esta talvez tenha sido uma das mais agressivas de toda a prova, pois em pouco mais de 4km de percurso subimos 1.200m de desnivel positivo (D+)."


"Espera-nos uma parede com 1300mD+. Há provas de 50km que nem isto têm e a gente ia mamar com eles ali em 8km depois de quase 12h de prova já. Definitivamente venham preparados amigos!"
"amigos antes de irem a correr inscrever-se já sabem. TREINEM que a coisa é dura."

E agora?? Abrandar os treinos?? AHAHA! Como me disse um amigo meu: olha, agora aguenta-te!


domingo, 11 de janeiro de 2015

Ano Novo, Proença a Nova (47km)

Três semanas depois do Ericeira Trail Run, este sábado foi dia de voltar a olhar para o Horizonte. Não estava nos planos até há pouco mais que uma semana, mas as saudades dos trilhos falaram mais alto e não resisti. A proposta era uma corrida de 40+ (47km, neste caso) que seria a primeira de 4 etapas do Circuito Território Centro, organizado pela Horizontes, esta a ser disputada em Proença a Nova. Como disse no post da Ericeira, apesar de não ter gostado especialmente da corrida, nunca seria fundamentalista ao ponto de dizer que não voltaria  a correr numa prova com aquela organização. Na verdade, tinha a certeza que mais cedo ou mais tarde iria correr outra, não pensei foi que fosse tão cedo!


Inscrevi-me na prova no último dia disponível para inscrições. O processo mental para a decisão foi o habitual: "ok, tenho os Abutres daqui a 4 semanas, Ericeira foi há duas, vou treinar bem e descansar até lá! ....Elaaaah!! olha aqui uma prova de 47km pra semana que vem! Pois claro que aceito!"

A primeira ultra do ano tinha partida marcada para as 9 horas de sábado em Sobreira Formosa. Arranquei de Almeirim com a Sara e o meu amigo e colega de equipa Vasco & família para a viagem de cerca de 150km que nos separavam de Proença, feitos sempre de noite. Foram 150km de temperaturas entre os 2 positivos e negativos, nada que não estivéssemos à espera! O levantamento dos dorsais foi feito sem problemas no secretariado que funcionava no local de partida. Já aqui, tive a primeira surpresa agradável do dia:

Provavelmente a t-shirt mais bonita que já recebi numa prova!
Como sempre, a imagem das provas da Horizontes é extremamente bem cuidada, e esta t-shirt é uma boa prova disso. 

O controlo zero e a concentração dos atletas para as duas provas foi feito no interior do museu Isilda Martins. Aqui foi dada uma partida simbólica seguida de um percurso de cerca de 200m para a verdadeira partida, nas ruas de Sobreira Formosa.

Concentração no interior do museu.
Temperaturas perto do zero, mas espírito e boa disposição em alta. Eram nove da manhã e estava na hora! A partida foi dada em conjunto para as duas provas (havia uma de 26km). Penso que não passou mais que um km para estarmos embrenhados na floresta. Um pinhal selvagem a perder de vista, cortado por estradas florestais cobertas de caruma que tapavam o xisto no chão. Sobe e desce constante que nos levava ou ao topo de montes, que nos mostravam um manto verde em 360º em todo o horizonte, ou a vales gelados cobertos de branco. Tudo dependia dos riachos que atravessámos vezes sem conta: se estávamos a chegar a ele é porque tínhamos deixado um pico e uma descida rápida, assim que o deixávamos para trás sabíamos que nos esperava uma subida!

Que venha a subida!
Como sempre, demorei algum tempo até estabilizar a respiração e o ritmo. Noto muito isto ultimamente, talvez por causa do frio. O que também demorou a estabilizar foi o equilíbrio: caí 3 vezes nos primeiros 6km! Acho que caí tantas vezes nestes 6km como no somatório de todos os trails que fiz. É do frio. Sim, vamos dizer que é do frio.

Os primeiros 15km foram assim. Trilhos apertados, uns mais outros menos técnicos, quase todos corríveis. Subidas duras, mas nunca demasiado duras ao ponto de não permitir desfrutar das descidas. E que descidas! Estou cada vez mais confiante no trabalho de reforço muscular que tenho feito, o que permite soltar-me nas descidas sem pensar nos quadrícepes dali a uns quilómetros. Ataco-as com um sorriso nos lábios e com adrenalina a sair por todos os poros!


Por volta dos 12/13km perdi-me, outra coisa que raramente acontece nas provas que faço. Não foi um grande desvio, talvez só 500 ou 600m, mas irrita-me muito perder-me! Ainda por cima foi completamente culpa minha, a sinalização estava impecável em todo o percurso. Estava a correr atrás de um colega e distraí-me. 

No briefing inicial o speaker avisou-nos para ter cuidado com os locais que estavam à sombra. Na altura não dei muita importância a isto, foi apenas durante a corrida que me apercebi. É verdadeiramente impressionante as diferenças de temperatura que se sente num espaço muito curto, quando passamos do sol para a sombra. Nunca senti nada assim! Os vales apertados por onde passámos provavelmente recebem poucas ou nenhumas horas de sol diárias, por isso o manto branco é permanente. Corremos ao longo de um desses vales brancos por um single track em cima de vegetação densa e fofa durante uns 2km, ao lado de um ribeiro. O branco da geada só era cortado pelo verde da erva no trilho. Dos sítios mais bonitos por onde alguma vez corri! 


A imagem possível. Claro que não faz justiça, mas conseguem ver o trilho na "neve".
O primeiro abastecimento sólido, aos 16km, chegou depois de um segmento bastante técnico numa encosta com muito xisto. Progressão muito lenta, com um precipício do lado esquerdo e uma montanha do lado direito. Até ali, melhor era impossível!

O abastecimento estava instalado na aldeia de Alvito e era completo QB, como é apanágio da Horizontes. Já aqui havia sopa quente, mas decidi não arriscar porque corria desde o inicio com um desconforto intestinal. Foi aqui o primeiro encontro com a minha equipa de apoio técnico, desta vez reduzida a um elemento já que temperaturas negativas e despertares às 5 da manhã são incompatíveis com crianças de ano e meio!

Esperavam-me agora outros 15km até ao próximo abastecimento. A julgar pelo perfil, seriam 10km com pouco desnível e 5km finais que nos colocariam a meio da grande subida da prova. Depois da Ericeira, a análise daqueles 10km deixaram-me com medo de apanhar um estradão longo e chato, mas não podia estar mais enganado. De facto, esta prova foi uma espécie de Anti-Ericeira. Disse na altura que me tinha desiludido a falta de critério na escolha do percurso, mas NUNCA senti isso em Proença! Sim, houve alguns (poucos) estradões e até asfalto para entrar e sair de 4 ou 5 localidades, mas tudo ali fazia sentido. 

Assim foi. Os 10km foram verdadeiramente espectaculares. Quase todos feitos num vale a acompanhar um riacho. O trilho era bastante apertado em terra mas com muito xisto. Ora numa margem ora na outra da linha de água. De vez em quando cortávamos para dentro da montanha e escalávamos uma parede, apenas para regressar logo a seguir ao rio. Muito bom!

A subida aos 650m da Serra das Talhadas foi feita em 8km. Com alguns segmentos muito duros. O ataque final foi feito por um trilho no meio de um pinhal, com uma inclinação brutal em zigue zague. Atingimos o ponto mais alto aos 35km. Seguia-se agora uma grande descida em estradão e estrada florestal.

Vista no topo da Serra, roubada do Google.
Foi na descida da Serra que levei uma lição de humildade. Afinal aquela confiança nos quadricepes era em excesso, e comecei a sentir isso a meio da encosta. Não abrandei, afinal já não faltava assim tanto, mas se quero pensar em objectivos maiores não posso chegar aos 40km com dores musculares daquelas! 

O ultimo abastecimento estava situado a 9km da meta, em Montes da Senhora. Era o mais completo dos três. Quanto à quantidade e posicionamento dos abastecimentos, foi completamente acertado. Quer em número quer na localização. Quando alguma coisa corre mal há que o dizer, mas o contrário também é verdade, e a organização desta vez esteve impecável em todo o processo. 

A personalidade do percurso manteve-se até ao ultimo quilómetro, mesmo antes da meta. 

O pórtico de chegada, instalado dentro do museu. 
Foram 5h44 para os 47km com 1800d+. Não faço ideia da classificação, mas para mim foi uma excelente prova. Cheguei em boas condições e diverti-me muito, como deve ser! 

Muito gira a medalha!
Mais uma vez levei a máquina de filmar. Já não me custou tanto transportar como na Ericeira, penso que já lhe apanhei o jeito. Ainda bem, porque gosto muito de ficar com estas imagens para recordação! Podem ver alguns dos sítios que descrevi. Ah, escusado será dizer para verem em HD e com som eheheh


Gostei muito da prova e adorei conhecer uma zona do país que conhecia muito mal. Já depois de chegar, em conversa com o campeão Luís Mota, ele dizia-me que a zona centro do país era das melhores para trails e completamente subvalorizada. Dou-lhe razão, e realmente em Portugal temos condições espectaculares para este tipo de provas.

Com os colegas de equipa Vasco e Francisco e o super Luís Mota. Atenção, o nosso Francisco Gaio foi 3º da geral! Um caso sério!
E pronto. Faltam agora 3 semanas para os Abutres. Vão ser 3 semanas de treino consciente, descanso QB e muito juizo. ....Elaaaahhhh uma prova de estrada com 17km a subir e descer a Serra de Sintra chamada GP Fim da Europa uma semana antes dos Abtures?? Claro que aceito!! :)