As minhas corridas na estrada

segunda-feira, 22 de junho de 2015

II Louzan Trail (52km) 2015 - Desilusão.

Custou-me escrever aquela palavra no titulo deste post. Custou-me porque me apercebi da dedicação e do muito trabalho realizado pelo Montanha Clube Trail Running, e vi sinceridade nos olhos dos voluntários que ao longo do caminho me confessavam, envergonhados, que a coisa não estava a correr bem. Custou-me por ter ouvido já no fim da boca do Luís Mota, uma das pessoas que mais gosto e admiro no desporto, um pedido de desculpas pelo que correu mal. Por isso tudo e por ter expectativas tão altas custa-me dizer que foi uma desilusão, mas a verdade é que foi. Não só pelo percurso que não foi totalmente do meu agrado (uma opinião pessoal e logo discutível, claro), mas pelas falhas óbvias de organização. No fim do dia só houve algo maior que a desilusão: a satisfação por ter conseguido chegar ao fim de uma das provas mais duras em que já participei.


O meu Louzantrail começou logo na sexta feira e os planos não podiam ser melhores: um fim de semana num dos meus sítios favoritos, Gondramaz, com a família e amigos. Ao todo éramos 9, incluindo dois amigos que iriam correr os 25km (lembram-se do Francisco?). Bom tempo, corrida, família, amigos, montanha...ah, vida boa! :)

Foto de família em Gondramaz
Os dorsais foram levantados na véspera, o que permitiu uma saída de Gondramaz bem descansada meia hora antes da partida da prova maior, numa altura em que o termómetro do carro marcava 22ºC. Nada que não estivéssemos à espera, a previsão era de temperaturas a rondar os 40ºC. Porque é que os meteorologistas só se enganam quando não convém? :\

Chegados ao centro nevrálgico da corrida, o Parque Carlos Reis na Lousã, ainda tive tempo de cumprimentar várias caras conhecidas antes da partida. Essa foi às 8:30 em ponto, numa altura em que já estavam os cerca de 160 atletas prontos para enfrentar os anunciados 45km com uns abismais 3500D+.

Primeiros metros. Aqui ainda era fácil.
Depois de percorridos cerca de 3km dentro da cidade entrámos finalmente na Serra por trilhos clássicos da Lousã, que já conhecia de outras aventuras. Apesar de ainda os reconhecer, a sensação de deslumbramento quando se penetra naqueles vales fundos ladeados por monstros ainda se mantém. A Serra da Lousã é brutal, e até ver o meu sitio preferido para correr. Uma espécie de parque de diversões da corrida, onde tudo é possível. Por enquanto corríamos numa face da Serra mais protegida do sol. A vegetação densa e o rio que atravessávamos de um lado para o outro tornavam o ar fresco e agradável, perfeito! O que não foi perfeito foi um companheiro que com 6km de prova achou que ainda ia a tempo de apanhar o Nuno Silva no 1º lugar, e então desatou a empurrar pessoal nestas passagens pelo rio de forma a ganhar preciosas posições. O resultado foi um colega empurrado que mergulhou na água fria e que se podia ter aleijado. Os óculos escuros do artista ficaram para trás esquecidos. O homem ia tão desembestado que nem nos ouviu a chamá-lo para devolver os óculos que eu apanhei e deixei no abastecimento mais próximo. Espero que não tenha tido problemas com os mosquitos que se esborracharam nos olhos devido à alta velocidade.

De nenúfar em nenúfar
Passado o fantástico Castelo da Lousã, continuei sempre em boa companhia pelos espectaculares trilhos que nos levariam até à aldeia do Talasnal. Num ritmo confortável e por trilhos muito bons para correr, ora subíamos (mais), ora descíamos (menos) ora abrandávamos para apreciar por momentos o sítio de sonho onde corríamos.

O espectacular Castelo da Lousã, tirado da net.
O Talasnal chegou depois de um subida bem empinada e um lance de escadas comprido, que já tinha feito a descer noutras aventuras  e que me deixou a escorrer água, completamente ensopado em suor. O abastecimento estava montado numa praça central da aldeia e ao pé estava um grupo de tocadores com um acordeão, um cavaquinho e mais uns instrumentos a animar o pessoal. Bananas, gomas, amendoins, tomate e batatas fritas. Fraco, mas é o primeiro, compreensível.  Comi uma banana com sal e emborquei 4 ou 5 copos de água. Antes de me ir embora fiz as habituais perguntas: a que km estamos, a que distancia está o próximo? "hmm ... err.... é o quilómetro 5 e tal, o próximo é +/- a 5 ou 6km". Olho para o relógio que marca 9km e olho para o rapaz meio atrapalhado. Confiro no dorsal, que tem uma representação do perfil altimétrico, que este abastecimento deveria estar aos 5.5km. Estávamos com 9km de prova e já com um erro de 3.5km. Não gostei, mas engoli.

Seguiu-se uma das subidas mais difíceis até então, cerca de 500D+ em 3km, até à primeira vez que tocaríamos a cota dos 1000m. Mais uma vez num trilho que já fiz a descer, bem embrenhado no meio do bosque num zigue zague furioso por entre as árvores. Uma daquelas subidas que dá prazer! Foi duro, muito duro, a fazer lembrar uma amiga que conheci na Madeira, mas igualmente divertida. Deixou marcas, mas soube muito bem chegar lá acima, sair da floresta e ter aquela sensação de missão cumprida.


Segundo abastecimento, 14.5km, duas horas e meia. Cheguei lá com fome e desgastado da subida, mas só tinham água e isotónico para me oferecer, assim aceitei. Mais uma vez não me souberam responder logo a que quilómetro deveríamos estar, mas chamaram outro membro da organização que confirmou o mesmo erro de 3.5km. Conformei-me com esta diferença, nem protestei (as pessoas que lá estavam não tinham culpa nenhuma). Incomodava-me mais a fome que tinha e fiquei um pouco receoso com a resposta "penso que no próximo há" quando perguntei quando haveria comida...

Seguiu-se a brutal descida até à aldeia de Candal. Brutal não tanto pela dureza, mas pela paisagem de postal que a Serra nos apresentava. Começou com um estradão muito inclinado e coberto de pedras soltas para depois entrar por trilhos e estradões mais suaves, que permitiam não ir tão concentrado no caminho e apreciar a paisagem. Afundávamo-nos num vale muito fechado, rodeado por monstros, e lá em baixo entalado entre as montanhas estava Candal com as suas casas de xisto.

Candal, tirado da net.
Cheguei ao abastecimento de Candal com quase 3 horas de prova e cheio de fome. Fui directo para a mesa da comida mas a perspectiva não era muito animadora.. Ao oferecido no 1º abastecimento só se juntava marmelada e um bolo seco que se empapava na boca à primeira trincadela. O desvio era agora de 4km em relação ao previsto, estávamos no quilómetro 18 e comia a segunda banana com sal do dia. Assim que saí do abastecimento fiz algo que cada vez faço menos, comi um gel e empurrei com água. Não gosto da sensação que dá, mas correr com fome ainda é pior.

A chegar ao Candal.
Eram 11 e meia e o calor já apertava, e muito. Comecei a parar em todas as fontes e ribeiros para molhar a cabeça e braços e assim foi até voltarmos à cota dos 300 e poucos metros por uma descida muito técnica após o Candal. Lá em baixo, no fresquinho, corremos um quilómetro na famosa levada, ponto de passagem obrigatório em todas as provas na Lousã. Infelizmente estava em obras e não tinha a água a passar, mas é sempre muito agradável correr no fundo do vale. Terminada a diversão, íamos começar a segunda grande subida do Louzan. que nos faria subir cerca de 600 metros em 5km, de volta aos 1000 metros de altitude.

Depois da levada iniciámos a subida por um troço onde passámos por 3 ou 4 escadotes (?) que desembocou num dos únicos segmentos em alcatrão. Foi cerca de 1km até voltarmos a entrar nos trilhos. À entrada deste novo trilho estavam vários bombeiros e um sinal de perigo, nunca é bom prenuncio :) Foi então que deixei de participar numa prova de trail e comecei um segmento de alpinismo. O local era uma cascata, que agora estava quase seca, por onde tínhamos literalmente que escalar. Várias vezes lancei os bastões para o patamar de cima e escalava as paredes como se fossem muros. Por esta altura apanhei um corredor veteraníssimo do nosso pelotão, que todos conhecemos, e que dizia raios e coriscos da organização, que aquilo era um exagero desnecessário e que se tinha inscrito num trail e não numa prova de aventura. Imagino o que terá dito uns quilómetros à frente, na subida ao Trevim...

A subida continuou durante muito tempo com a vegetação a ficar cada vez menos densa. Perto dos 1000 metros de altitude deixou mesmo de existir e agora escalávamos por estradões áridos completamente expostos ao sol. Apesar de ser a 4ª prova que faço na Lousã, nunca lá tinha corrido com céu limpo. É impressionante contemplar aquela paisagem e quase compensou o escaldão que apanhei no pescoço!

Estávamos novamente nos 1000m de altitude e lá ao fundo já se viam as antenas do Trevim, por isso psicologicamente foi duro quando tivemos que descer vertiginosamente outra vez até aos 600m, local onde estava o 3º abastecimento de sólidos, aos 27km (supostos 21km) na aldeia de Cerdeira.

Cerdeira
Este abastecimento foi em conjunto com a prova de 25km por isso estava cheio de gente. Foi bom porque encontrei o João, que estava comigo em Gondramaz, mas nunca me sinto confortável em abastecimentos muito cheios. A barraca da Super Bock fazia sucesso, mas durante a prova dispenso, por isso virei-me para a mesa da comida que estava cheio de fome. Bananas, gomas, tomate, amendoins..... Procurei por algo mais substancial como uma bifana ou sopa, mas tive que me contentar com mais uma banana com sal. Sabia que de seguida iria enfrentar a subida mais difícil da prova e não gostei nada de sair do abastecimento com fome. Meti mais um gel que disfarçou o desconforto e pus-me a caminho. 

O petisco seguinte era a conquista de Trevim, no ponto mais alto da Lousã aos 1160 metros. Era a minha quarta subida ao Trevim, mas foi de longe a mais difícil de todas. Refresquei-me numa fonte antes de enfrentar os cerca de 700D+ em menos de 3km.
Trevim
O sol estava a pique e forte como nunca. As temperaturas rondavam os 40ºC e o ar era muito seco, partimos da cota 600m, por isso a vegetação não era muita. Sabia que ia ser duro, mas nunca pensei que fosse tanto. Metade da subida foi por uma cascata seca, completamente coberta por pedras soltas e grandes, utilizei novamente a táctica de atirar os bastões lá para cima para conseguir escalar. De vez em quando atrás de mim rolavam dezenas de pedras grandes que eu receava atingissem alguém lá atrás. Pouco depois fui que quase acompanhei as pedras e fiquei de costas agarrado a um ramo seco. Uma escalada quase vertical, perigosa, que quando saiu da cascata continuou numa face completamente exposta da Serra. Não havia trilho, as marcações estavam apenas espalhadas na encosta, a subida era quase vertical com uma inclinação brutal. Confesso que não gostei desta subida. Não por ser dura, não é preciso pensar muito para me lembrar de subidas mais longas e duras que já fiz e gostei, simplesmente achei aquilo absurdo e desnecessário. Um exagero. Podem chamar-me menino à vontade, não estou aqui para ficar bem na fotografia, para mim a prova não tem que ser extremamente dura para ter qualidade e aquela subida, volto a frisar: na minha opinião, passou um pouco dos limites.

Demorei 24 minutos a cumprir o ultimo quilómetro da subida e a entrar no recinto das antenas do Trevim com 30km. Lá em cima vi algumas pessoas a atirarem a toalha ao chão e o caso não era para menos. Apressei-me para ir ao abastecimento que, mais uma vez, tinha apenas liquido. Desta vez a minha primeira pergunta não foi "a que quilómetro estamos" mas sim "quando é que há comida?". É no próximo, responderam eles. 

Descíamos agora na outra face da Serra, muito mais árida que a anterior. A subida começou por um trilho aos ésses entre árvores altas, muito divertido, mas logo desembocou num estradão ligeiramente a descer completamente exposto ao sol que se prolongou por 2 ou 3km. Os primeiros 30km tiveram 2400D+, uma enormidade, mas felizmente ainda tinha pernas para conseguir fazer o estradão a trote. Quando o corpo já se estava a habituar a esta nova solicitação, tau, toma lá uma subida de cento e tal metros verticais por um estradão! Subimos, subimos, chegámos às eólicas novamente, andámos 200 metros em plano e descemos por um trilho paralelo à subida, onde até dava para ver os companheiros que ainda subiam. Estes carroceis justificam-se quando a orografia do terreno não dá para mais, mas na Lousã...? 

Descíamos agora no que penso ser um trilho para o BTT, já que corríamos dentro de um carreiro fundo e muito estreito, com uns 20cm de largura, que subia e descia no meio dos pinheiros. Era difícil correr ali e aquele sobe e desce já me estava a parece novamente desnecessário. Há muito tempo que já não passávamos por nenhuma fonte ou ribeiro, dos nossos passos resultava uma poeira fina incomodativa que aumentava a sensação de secura. 

Cheguei ao abastecimento dos 30km com 37km de prova. Era o último abastecimento de sólidos por isso andava a sonhar há algum tempo com comida a sério que de certo estaria ali. Mas não. Bananas, gomas, amendoins, batatas fritas... Seis horas e meia de prova, fui para a 4ª banana com sal do dia. As meninas do abastecimento diziam bem dispostas que as gomas estavam a ser um sucesso. Quando repararam no olhar de quem lá estava quando disseram aquilo, acrescentaram "um sucesso, mas entre nós! eheheh" :\

A sério..?
Mais um gel no bucho e fiz-me ao caminho.

Continuámos por uma zona da Lousã que não conhecia, mas também não fiquei com saudades. Trilhos chatos, muito duros, um sobe e desce muito acentuado que me estava a dar cabo do juízo. A meio do caminho para o abastecimento oiço uma voz lá de cima a perguntar se quero água. Olho para o relógio e, fazendo conta ao desvio, os quilómetros batiam certo com o abastecimento dos 35. Digo que sim, e logo três rapazes descem o monte a correr com garrafões de água nas mãos! Afinal não era um abastecimento, eram 3 pessoas da organização que conscientes das dificuldades que estaríamos a passar andavam a oferecer água a quem encontravam pelo caminho! Espectacular e, lá está, por estas e por outras custa-me dizer que foi uma desilusão. 

Cheguei ao abastecimento do Terreira das Bruxas com 44km. Já estava confuso e não sabia em que abastecimento era suposto estarmos, se dos 35 ou 40km, por isso perguntei a quem lá estava. Ninguém respondeu e reparei que olharam entre eles de uma maneira um bocado envergonhada, até que um engraçado me pergunta "em que quilómetro estás?" 44, respondi eu, "então é isso!"....

Terreiro das Bruxas
Este abastecimento, apesar de estar anunciado apenas de líquidos, tinha as habituais bananas e laranjas. Só não reparei se havia gomas. No entanto nem consegui comer nada, o organismo já estava a desligar e cada vez estava mais frustrado com os agora 9km de diferença do previsto. Despachei-me dali e comecei a descer para os 10km finais de prova.

Antes de começar a ultima grande descida passámos por uma cabana de escuteiros onde estavam dois voluntários, miúdos novos. Indicaram-me o caminho e logo de seguida um deles, meio enfadado, pergunta-me "ainda faltam muitos?" ahaha

A julgar pelo perfil que nos entregaram a descida seria continua e prolongar-se-ia até ao próximo abastecimento, a 5km da meta. Fiz-me a ela com ânimo, a meta já estava próxima e ainda por cima estávamos a voltar ao lado bom da Lousã. Foi uma boa descida, muito variada, com troços técnicos, passagens por aldeias do xisto e subidas íngremes...! Pois, afinal não era bem sempre a descer até ao abastecimento, aliás, a descida ainda teve lá pelo meio uns 200D+! 

Foi na subida final, por um estradão que percorremos em sentido inverso no início, que rebentei. Arrastei-me sem dignidade por aqueles metros que nos levaram de volta ao Castelo e parei várias vezes para recuperar o fôlego à sombra. Era lá no Castelo, aos 49km (supostos 40) que estava o último abastecimento. Lá chegado sentei-me no chão e estiquei as pernas. Bebi a água quente que me davam e ouvi as queixas e frustrações de quem lá passava. As pessoas estavam indignadas, e com razão, compreendo que a certa altura tenham que descarregar. Mas eu não gosto de o fazer junto dos voluntários que estão nos abastecimento que não têm culpa nenhuma. Um dos membros da organização presentes lamenta que tenham sido feitos tantos esforços para proporcionar uma prova de topo e que depois as coisas tenham corrido tão mal, ao mesmo tempo que nos dava ânimo para os 6km até ao final. 

Os últimos quilómetros começaram por ser feitos ao longo de um riacho. Cruzámo-lo vezes sem conta e nesta altura já nem procurava rochas secas, muito pelo contrário. fazia mesmo questão de enfiar as pernas dentro de água, de preferência até ao joelho. 

Cheguei ao fim 10 horas certas depois de começar, completamente exausto e rebentado. Os últimos 6km, que afinal foram 4, contribuíram para os 52km de prova com 3000D+. Agora vem-me à cabeça os 50km dos Abutres, que com todos os condicionalismos ainda assim foram cumpridos em uma hora a menos! Fui 39º classificado, mas entre os cerca de 160 que iniciaram a prova somente 87 terminaram, quase metade!



Foi uma prova dura. Muito dura. Quase como se o objectivo principal da organização fosse proporcionar uma experiência extrema aos participantes, e essa foi uma das razões da minha desilusão. Quanto à minha apreciação do percurso é meramente uma opinião pessoal, o que não posso concordar é que, como já li por aí, digam que a organização foi "imaculada" e os abastecimentos "top". Até as marcações deixaram algo a desejar, com uma tendência para poupar fita. As falhas são facilmente resolúveis e aposto que para o ano não vão existir, o tipo de corrida é que, a manter-se, não me vai voltar a cativar. Enfim, é a minha opinião e pelo que tenho lido no facebook contrária à maioria dos comentários. O que vale é que ninguém me leva a sério!

segunda-feira, 15 de junho de 2015

II Grande Trail das Lavadeiras (42km)

Estava muito ansioso por participar nesta corrida. Já há uns meses que tenho falado com o João Marques, um membro da organização, que me andava a contar como estava a correr a preparação. Apercebi-me do trabalho duro que estavam a ter e associei muitas vezes ao nosso Trail de Almeirim. A proposta era uma prova de montanha com 42km, na região do Baixo Mondego. À primeira vista parece uma parvoíce fazer um trail numa zona com aquele relevo. Quase tão parvo como fazer um na Lezíria Ribatejana!


Levantei o dorsal no dia anterior e fui com a família passar a noite a Montemor o Velho, a pouco mais de 7km de Granja do Ulmeiro, base do GTL. Como a partida da prova era às 8:30 achei que, ficando lá, sempre dava para dormir mais umas horas. O raciocínio era bom e válido, mas a minha rica filha achou que 4 da manhã era uma hora perfeitamente aceitável para acordar e a estratégia foi por água abaixo. 

Pequeno almoço farto tomado no hotel (quem é que resiste a buffets de pequeno almoço em hotéis?), e às 8 estava na zona de partida. Por lá andavam já os outros 36 participantes na prova longa, aos quais se juntaram cerca de 400 que partiriam mais tarde para o trail curto (21km) e caminhada. No dia anterior, em conversa com a Sara, ao aperceber-me que eram tão poucos disse: "epah, é desta que consigo um top10!!", ao que a Sara respondeu com um pfff e revirar de olhos. Mas eu estava decidido: ia fazer um brilharete nas Lavadeiras!!


Aquecimento feito (mais uma vez, parto do principio que estar especado a olhar para o relógio de 30 em 30 segundos conta como aquecimento), posicionei-me estratégicamente na recta da meta, pus a minha game face, estudei a concorrência e preparei-me para a luta. A partida foi dada em contagem decrescente e rapidamente pus um ritmo alucinante para me juntar ao grupo da frente, éramos 7, estava dentro do objectivo. Seguiu-se um trabalho psicológico brutal. Estudei cada membro do grupo ao ponto de prever ataques deste ou do outro. Respondi a todos e andei no limite das minhas capacidades. A certa altura aproximei-me da primeira posição, mas logo de seguida respondiam ao meu ataque. Foram momentos muito intensos, uma brutalidade! Aguentei-me no grupo da frente até ao limite, mas tive que ceder quando não consegui mais. Foi uma luta épica que durou... ora deixa cá fazer as contas... 200 metros! Mas, hey, foram 200 metros do caraças!

Devaneios à parte, mudei o chip para o habitual e preparei-me para encarar os restantes 42km desta maratona de montanha. A organização apontava para 1400D+ (e bateu certinho) o que, numa prova tão longa, não assusta muito. Mentalizei-me que seria relativamente rolante e apontei para ritmos entre os 6 e 6:30 min/km .

A entrada nos trilhos aconteceu ainda nem estávamos com 500 metros e os primeiros 12km corresponderam ao que imaginei: muitos single tracks corríveis, num constante sobe e desce, curvas e contra curvas. Ou seja, diversão garantida!


sobidesce sobidesce sobidesce
Chegámos aos 12km depois de percorrer um estradão (um dos muito poucos onde passámos) de 2km, ao longo de uma plantação de arroz. Lá estava localizado o 3º (!!) abastecimento. Nunca tinha estado numa prova com tantos abastecimentos/km. Com excepção de um que estava a 8km, todos os outros estavam separados por 4 ou menos km. No total foram 10 em 42km! Muito completo s, em quase todos haviam bombeiros e em todos havia pessoal muito simpático e prestável. Ah, e muito importante, estavam exactamente no quilómetro anunciado, do 1º ao último.

O vassoura Pedro Santos num abastecimento
Saí deste abastecimento com uma média perto de 5min/km e boas sensações. Estava confiante para o resto da prova e achei que ia acabar mais cedo que o previsto. Mas foi então que as Lavadeiras me deram a volta e a prova mudou completamente de cara.

Os quilómetros seguintes foram incríveis e um verdadeiro hino ao trail. O Baixo Mondego não tem muita altimetria, não tem paisagens de cortar a respiração nem subidas que se prolongam quilómetros. Mas o Baixo Mondego tem um grupo de pessoas trabalhadoras que meteram na cabeça que iam proporcionar uma grande experiência a quem decidiu confiar neles. Meteram mãos à obra e abriram literalmente quilómetros de trilhos pelos sítios mais incríveis. Duma zona completamente inacessível, com mato cerrado, eles viam um trilho super técnico de muito difícil progressão. De ravinas viam uma descida alucinante só ultrapassável com cordas. De uma parede com poucos metros eles viam o sitio ideal para colocar degraus de madeira. Passei quilómetros dobrado para não bater na vegetação que nos cobria. Usei as mãos para me agarrar em troncos e pedras para subir ou para descer sem cair. Saltei por cima de dezenas de troncos. Andei na lama (pouca), em terreno muito difícil e em terreno que mais parecia um colchão. Trilhos que se prolongavam muito tempo e quase dispensavam marcações, que estava irrepreensível em todo o percurso. Andei entre pinhais, eucaliptais, campos de cultivo... Nunca tive aquela impressão de estar sempre no mesmo sitio. Entrei em dezenas de trilhos devidamente identificados com uma placa e ligados por escassos metros de estradão. Incrível o trabalho que este pessoal ali teve!

Rolante?
Foram muitos quilómetros assim, sempre intercalados com secções em que dava para correr, sempre em trilhos. O corpo estava a ressentir-se muito desta tareia e desde o inicio que corria completamente encharcado em suor por causa da elevadíssima humidade e temperaturas a rondar os 20ºC. Por volta dos 37km, e ainda com aquela sensação de não saber bem o que me tinha passado por cima, comecei a ter cãibras. Contam-se pelos dedos de uma mão as vezes que tive cãibras em toda a minha vida, mas naquela subida os músculos das pernas começaram a ceder, um por um. Daí até ao fim foi maioritariamente a descer, mas sempre por trilhos técnicos que solicitavam todo o tipo de esforços ao corpo. Era um suplicio cada vez que tinha que transpor algum obstáculo mais técnico, com os músculos a ameaçar saltar.

3000m obstáculos
Os trilhos mantiveram-se quase quase até ao fim, desembocando na recta da meta que não tinha mais que 500 metros. Cheguei lá MUITO longe do tempo que imaginava quando passei aos 12km. Cinco horas e meia (média de 8min/km!) que me valeram o 15º posto, como sempre a meio da tabela.

Top 10? AHAHAH!! Não, a sério? TOP 10?? LOL
Na meta estavam como sempre a Sara e a Mel que me receberam com um abraço. Desta vez a diferença é que também me tiveram que ajudar a andar, porque os músculos das pernas acharam que 42km tinha sido o suficiente e decidiram que não faria o percurso carro-chuveiro sem me darem um cãibra geral! C'um caraças, até nos pés tive cãibras!

Estiiiiica!
Terminámos uma excelente manhã com o saboroso almoço servido pela organização, entre conversas com algumas caras conhecidas, antes de voltarmos a Almeirim.

Não quero acabar esta crónica sem bater num ponto. É inadmissível que uma prova com a excelência desta tenha tido apenas 37 atletas na partida da distancia rainha. Todos os que estiverem a ler isto, façam um favor a vocês próprios e não falhem a terceira edição. É uma prova brutal para se iniciarem no trail. Não estou a falar daquele "trail do estradão", mas trail a sério. Feio, sujo e mau. Bem localizado, perto de Lisboa, Coimbra e Porto, com uma organização que esteve perfeita em todos os aspectos. Os meus parabéns ao João e aos restantes Lavadeiros. Foi perceptível o vosso trabalho árduo e dedicação. Da minha parte só vão ouvir elogios. Bem, elogios e eventualmente também me vão ouvir a gemer em sofrimento, é que levei uma tareia brutal!! Obrigado e até para o ano!


segunda-feira, 8 de junho de 2015

Equipamento Outpace - uma crítica censurada

A Sport Zone, em parceria com o programa de rádio TSF Runners, enviou-me um equipamento da Outpace, igual ao da Federação Portuguesa de Atletismo, para testar. O equipamento foi-me entregue na segunda feira e teria que o testar até sexta feira. Liguei de imediato para o Departamento Técnico do Quarenta e Dois, que me confirmou a disponibilidade, e aceitei o convite da TSF. Agradeço publicamente aos técnicos que conseguiram arranjar espaço numa agenda preenchida por vários compromissos com... nada. Ah, e "os técnicos" sou eu. Bem, são pormenores, vamos a isso.

Só roupa espalhada no meio do chão...
Tenho que admitir que sou um gajo super básico no que toca aos calções e t-shirts que uso. Tenho 3 ou 4 pares de calções curtos com os quais faço rotação. Os que gosto mais e uso quase sempre em prova foram oferecidos na Maratona de Sevilha, em 2013. Quanto às t-shirts penso que, contas por alto, 90% das que tenho no armário são da Roly, oferecidas em prova. Na verdade não compro uma t-shirt para correr desde....bem, nem sei, mas já foi há uns bons anos!

"Tira outra, não posso ficar a rir!"

Calções

Quem segue o blog sabe que eu sou adepto dos calções curtos, à "intiga". Experimentei calções de compressão até ao joelho mas não me dei muito bem, e os calções de licra que tenho são de um modelo muito manhoso que passados 5km encontram caminho para as minhas virilhas, tornando-se muito desconfortáveis. No entanto, é fácil de constatar que a grande maioria do pessoal que anda nos trilhos prefere este tipo de calções. Foi por isso com bastante curiosidade que experimentei este topo de gama da Outpace. 


A primeira impressão foi muito positiva. O tecido pareceu bastante respirável mas ao mesmo tempo denso o suficiente para não se enfiar onde não deve. Fiz um treino de 25km com eles, nunca senti nenhum desconforto relativamente à arrumação do material nem a nível de assaduras. Contrariamente ao que achava, não senti que tivesse menos facilidade de movimentos que os meus habituais calções curtos, mas a maior diferença tem a ver com o conforto térmico. Está certo que o tecido é bastante bom e transpirável, mas não deixa de ser tecido e não se pode comparar com a perna ao léu. Gostei do ajuste à cintura mas senti falta de um pequeno bolso para levar a chave do carro. Já a Sara continuou com a sua campanha contra o meu equipamento de corrida. Ou são curtos de mais e saio quase de rabo à mostra, ou justos de mais, depois deixam pouco para a imaginação e vê-se os contornos do não sei quê..... Enfim, o melhor é sair de calças de fato-de-treino de algodão!

Censurado.

Camisola

A camisola tipo caparreira (de cavas) é outra peça que não costumo usar, como podem constatar aliás pelo bronze nos meus braços. Pedi o habitual tamanho M, mas neste modelo ficou-me um bocado apertada (ou será que é mesmo assim?), o que aumenta o factor show-off de músculos que ainda por cima não tenho. Mais uma vez, a primeira impressão ao tacto foi muito boa. O tecido é super leve e dá a ideia que tem mais espaços vazios do que tecido, o que o torna muito respirável e aumenta a sensação de leveza. Todos os treinos que fiz foram sob um calor intenso, inclusive os 25km que foram corridos entre as 10:30 e 13 da tarde, mas nunca tive aquela sensação de t-shirt molhada que tenho com as camisolas das provas. O único desconforto foi causado pelo tamanho, que devia ter sido um L. 

Eu disse que ia depilar os ombros...
 Conclusão

Não fiquei rendido aos calções compridos, continuo a preferir correr com curtos, mas a qualidade destes é inegável. Além disso estou convencido que o problema de assaduras nas coxas que tive em Portalegre ficaria completamente resolvido com uns calções destes. São definitivamente uma opção a considerar. Já a camisola de cavas dou pontuação máxima pelo conforto térmico que me proporcionou, incomparável com as t-shirts de provas que costumo usar, mas também não se esperava outra coisa. 

Quanto ao aspecto e design fiquei agradavelmente surpreendido, confesso que não lhes achei muita piada quando vi as fotos que anunciavam a parceria da Outpace com a FPA. Gosto especialmente da camisola que acho muito bem conseguida, já os calções são um bocado esverdeados de mais para meu gosto, mas isso pode ser a azia a falar (JORGE JUDAS!!!). Aproveito também para frisar que todo o equipamento é feito em Portugal, o que é o mais lógico e de louvar. 

Tenho apenas um ponto negativo a apontar, além do meu gosto pessoal por calções curtos, t-shirts de manga curta e de ter experimentado um tamanho abaixo do meu: o facto das letras a dizerem Outpace terem começado a descolar dos calções ao fim de uma utilização. 

Concluindo, não há dúvida que o equipamento é topo de gama. Afinal de contas não podia ser de outra maneira já que equipa os nossos atletas, inclusive os da selecção de trail que esteve em Annecy. Acho muito interessante que seja comercializado, tal como é habitual ver com o equipamento da selecção de futebol. Não encontro informações sobre o preço em lado nenhum, por isso não me posso pronunciar sobre isso, mas parece-me uma excelente opção para quem quer investir num equipamento que não seja da Roly ou da Makito.






terça-feira, 2 de junho de 2015

Criticas Honestas #1

A Sport Zone, em parceria com o programa TSF Runners, enviou-me este equipamento da Outpace, igual ao da selecção nacional de atletismo, para testar até sexta feira.

Aviso portanto os repórteres do Almeirinense que me virem pelas ruas da nossa cidade que não sou nenhum atleta de trail que se perdeu a caminho de Annecy, muito menos o Arnaldo Abrantes versão pós-lavagem a 90º.

Já preparei uma bateria de testes, que incluem obviamente o Teste do Rábassado, o Teste da Arrumação do Material e, já que quero usar o equipamento todos os dias, o Teste da Segunda Volta.

Para uma sintese da minha opinião oiçam o programa sexta feira, depois das 16.00 ou no domingo depois das 10.30, na TSF claro. O post mais detalhado, com tudo o que nunca.... perdão, SEMPRE quiseram saber acerca deste equipamento sai lá para o fim de semana!

Agora vou fazer a depilação aos ombros para usar a caparreira com alguma dignidade.