Este domingo corri a minha segunda prova de estrada do ano. Foi em Évora, a minha cidade portuguesa preferida. Desde que descobri a montanha têm sido cada vez menos as incursões no alcatrão, mas desenganem-se se acham que é por já não gostar. Foi no alcatrão que descobri a minha paixão pela corrida, naquela Meia Maratona de Lisboa, em 2003, onde levei das maiores marretadas da minha vida. Não, eu tenho corrido poucas provas de estrada porque, pura e simplesmente, tenho medo delas!
Partida brutal na Praça do Giraldo |
Passo a explicar: eu não vou para estas provas passear. Não contem comigo para essa coisa do "ir em ritmo de treino". Tenho plena consciência que nunca hei-de ganhar nada, mas raios me partam se não deixo tudo o que tenho na estrada! Há muito poucas coisas que se comparem a irmos no limite, com todas as fibras do copo a pedir para parar ou abrandar, com músculos a arder, garganta com sabor a sangue, passar aquela ultima subida, aguentar naquele fio da navalha mais 100, 200, 3000 metros, dum lado a glória, do outro o inferno de ter de ceder, dentes cerrados, braços desconexos, passadas exageradamente largas, vês a meta, olhas para o relógio, mais um pouco e... vocês sabem o resto!
Até. À ultima. Gota. |
A meia de Évora está incluída no circuito Running Wonders. Cinco corridas em locais turísticos, património da humanidade. A ideia de aliar a corrida ao turismo agrada-me bastante, pelo menos antes de começar a correr. Tenho que ser sincero, para mim, ao contrário de numa prova de trilhos onde os sítios onde passamos têm uma importância fulcral, na estrada isto só é importante até àquele momento mágico que é o tiro de partida. A partir daí meto a minha "game face" e só uma coisa importa: chegar ao fim o mais depressa possível.
O tiro de partida foi dado na Praça do Giraldo. Lá estavam os cerca de 2000 atletas, divididos pela meia, mini (10km) e caminhada. Felizmente, os cinco mil anunciados pela organização não se confirmaram, porque nem a Praça nem os dois quilómetros iniciais dentro da parte histórica comportariam tanta gente. Foram dois quilómetros de uma espécie de trail urbano (seja lá o que isso for) que passou pelos espaços mais emblemáticos da cidade. Aqui reside a única critica que tenho a apontar a uma organização que roçou a perfeição. Preferia que após o inicio a prioridade fosse escoar o pelotão imediatamente para as avenidas e se guardasse a incursão mais urbana para o final. As bandas filarmónicas, as tunas, os músicos de rua, os monumentos e as travessas estreitas acabaram por ser abafados pela urgência de zigue-zaguear até encontrar caminho livre para correr. Esse, encontrei-o antes do terceiro quilómetro, quando entrámos nas variantes largas nas quais andámos 95% do percurso. Aí sim, começava a prova.
A meia de Évora não foi uma corrida fácil, tinha bastantes e longas subidas e este dia teve a agravante de estar uma grande ventania. Sim, estou a falar das subidas numa prova de 21.1km com 200d+! Há quem diga que uma prova de estrada com subidas é bom para o pessoal do trail, mas eu não podia estar menos de acordo. Estamos a falar de coisas completamente diferentes. Partindo do principio que vamos a um ritmo muito próximo do nosso limite em plano, uma pequena rampa pode ser tão assustadora como uma parede de 500d+ nos trilhos. Não há gestão de esforço, não há mãos nos joelhos ou parar a meio para recuperar o fôlego. O objectivo é um e só um: chegar lá acima e prejudicar o menos possível o ritmo médio, nem que para isso se chegue aos 200 bpm.
Aqui não dava para fugir do empedrado. |
Apesar do percurso ser praticamente todo fora do centro da cidade, a presença de pessoas a apoiar foi constante, como tenho visto em muito poucas provas! Outra coisa que reparei foi o rigorosíssimo policiamento das ruas, a cidade literalmente fechou para esta corrida e é assim que deve ser. No geral, como disse no inicio, foi uma corrida que em termos organizativos esteve praticamente perfeita, apenas com o reparo que referi. Foi a corrida que Évora há muito merecia e será sem dúvida nenhuma um ponto de retorno anual obrigatório para mim.
Foto do Sérgio Nuno Pontes |
A minha prova foi exactamente o que estava à espera, muito aquém do que sou (e já fui) capaz. No inicio do ano, quando soube desta corrida, pensei que seria uma oportunidade excelente de finalmente fazer uma meia a sério, a rondar 1h25. O plano era após o UTAX dedicar-me 100% a ela, mas a porcaria da lesão estragou tudo. Sabia que estava a valer qualquer coisa à volta de 4:30 min/km e foi para esse ritmo que corri. Acabei com média de 4:24 e 1h34 de prova. Nada de especial, mas acreditem que foi TUDO o que tinha, por isso fiquei muito satisfeito.
Das medalhas mais bonitas que já recebi! |
Tinha muitas saudades de correr na estrada. Confesso que me faz confusão o pessoal do trail que diz detestar estrada. Eu adoro correr, ponto. Não acho uma seca correr na estrada, simplesmente porque correr nunca será uma seca! Estas provas populares, para mim, representam a corrida no seu estado mais puro. Não há elementos externos a influenciar, há o teu corpo e a maneira como o preparaste. Ele não te vai entregar nem mais um grama do que lhe deste nas semanas anteriores, mas vai compensar-te o trabalho a 100% e isso para mim é lindo!