As minhas corridas na estrada

domingo, 23 de fevereiro de 2020

Armada Portuguesa do Trail. Agora percebo!

Apesar de já terem passado mais de três meses desde que estou a treinar com Armada Portuguesa do Trail (APT) do Paulo Pires e do Armando Teixeira, andava a adiar este post. Adiei porque queria estar mais por dentro do que é a APT. Mais do que planos de treino, diziam-me, a APT é toda uma filosofia, uma maneira de estar no desporto e no trail em geral. Muito mais do que performance, interessa-lhes proporcionar ao atleta ciclos de treino conscientes, que permitam a prática da corrida por muitos e saudáveis anos. Era isso que me dizia o meu bom amigo Hugo Sá, quando me falava da sua amada APT, e foi isso que me disse o grande Armando Teixeira, nas várias conversas que tivemos ao telefone antes de decidir em definitivo entrar. 


Apesar de não ser um veterano, não sou propriamente um novato na corrida de rua e no trail, mas nos mais de dez anos que corro com regularidade nunca tive treinador. Felizmente, tive a sorte de não ter sido perseguido por lesões e fui aprendendo com os erros, fui ajustando os meus treinos conforme me sentia  e experimentando coisas novas para ver se funcionavam. O ano de 2019 foi como que o culminar deste meu "método". Treinei praticamente todos os dias do ano (330 e tal), fiz 4500km, 140k D+, horas e horas sem fim no monte, provas fim de semana sim fim de semana não, umas melhores, outras piores... Não que estivesse, de todo, descontente, afinal de contas estava a fazer nada mais nada menos do que exactamente aquilo que me apetecia, mas senti que não era uma coisa sustentável. Não concebia fazer menos do mesmo que estava a fazer, não é a minha maneira de ser, então a solução teria que ser fazer menos mas diferente. Melhor. 

No dia 1 de Dezembro comecei, de maneira ainda relutante, a treinar com a orientação da APT. Fazia-me muita confusão não poder fazer o que me apetecia ou, ainda mais, chegar à aplicação da APT e ver que no fim de semana só tinha 2 ou 3 horas para fazer, em vez das 4 ou 5 que passaria no monte em qualquer fim de semana. Mas estava 100% comprometido (nem consigo fazer as coisas de outra forma) e segui à risca todos os treinos que me eram prescritos. Passei a treinar segundo a minha frequência cardíaca (nunca tinha usado uma banda na vida), passei a falar com o Armando 1 ou 2 vezes por semana e, gradualmente, comecei a ligar os pontos. As coisas começaram a fazer sentido. Comecei a treinar durante a semana a níveis de intensidade impensáveis há uns meses, percebi o sentido que faziam os dias de descanso e recuperação. Os treinos de fim de semana no monte foram aumentando em duração e em intensidade e sentia claramente evolução durante a semana, conseguindo ritmos mais altos para o mesmo pulso. 

Este fim de semana participei pela primeira vez num dos famosos estágios da APT. Cheguei a Manteigas na sexta às 20:40 com o Ludovico e o Stefan, 10 minutos depois da hora marcada para o arranque do primeiro treino (parte 1, parte 2). À nossa espera estava o resto da malta, equipados, ao pé da Casa do Padre, onde iríamos dormir. Rapidamente nos juntámos a eles para o primeiro treino: uma subida pela estrada às Penhas Douradas. 5km a subir, 5km a descer, sob um céu espetacular. O clima era de festa mas as indicações eram claras: cada um subiria dentro do intervalo de intensidade prescrito. 

O prato principal foi servido no sábado, 36km com 1700+. Partimos todos juntos às 9 da manhã, depois de um pequeno almoço conjunto numa pastelaria. Mais uma vez, a ideia era treinar e não passear, pelo que rapidamente encaixei no ritmo do Stefan e do Jorge Duarte e, juntos, fizemos um dos melhores treinos que fiz na vida. Os três com andamentos muito parecidos em trilhos de sonho pelo planalto do Vale Rossim, descidas no limite até ao Vale Glaciar, subidas a doer até aos Poios Brancos ou Penhas Douradas. Frio lá em cima, calor cá em baixo, conversa, riso e pernas rebentadas no fim. Um buffet com tudo o que tive direito numa manhã perfeita de trail. 

Eu e o Jorge e o Stefan (a tirar a foto) no Vale do Rossim.
Já a sobremesa foi servida hoje de manhã, num percurso mais curto e menos violento. As pernas agradeceram. Seguimos a Rota do Javali, que nos levou ao inacreditável Poço do Inferno por uma descida a fazer lembrar o PR7 da Freita. Foram 14km e quase 800+ culminados com uma sessão de crioterapia em Manteigas.

Eu e o Jorge na Crioterapia
Mas não é pelos três treinos do fim de semana ou por sentir evolução ao longo dos últimos três meses que decidi escrever agora este post. Escrevo-o hoje, num domingo à noite, aquele horário reservado para escrever depois daquelas provas que me deixam nas nuvens, porque este fim de semana percebi finalmente o que é a APT. 

Percebi-o hoje, depois de almoço, num restaurante em Manteigas, enquanto falava com pessoas que tinha conhecido na sexta feira. Falávamos não apenas de corrida, mas das nossas vidas, como amigos que se conhecem desde pequenos. Ainda embebedado por 3 dias de montanha, sorriso nos lábios, caras queimadas do sol, entre risos e conversa. Percebi finalmente que a APT é muito mais que um plano de treino numa aplicação. A APT foram os três dias que passei este fim de semana na Serra da Estrela. Foram as duas noites nas camaratas da Casa do Padre, os jantares na Cascata e os pequenos almoços na Floresta. Foi o toque de alvorada do Hugo, as histórias do Seabra, o Imodium do Jorge. A calma do Ludo e a experiência da Rosário. É a Kika e a Ivone, os ovos estrelados do Gil e a omelete do Stefan. A APT é o Armando, uma espécie de figura paternal de todos nós, alguns até mais velhos que ele, mas que todos, sem excepção, olhamos com admiração. 

Escrevo este post hoje porque percebi que, com evolução ou não, é ali, no meio deles, que quero estar. Obrigado ao Hugo e ao Armando por me abrirem as portas. Agora é hora de dormir que amanhã é dia de A2!

A malta (quase) toda no Poço do Inferno.