As minhas corridas na estrada

segunda-feira, 3 de abril de 2017

Ultra Trail do Piodão 2017 (50km) - Dava para pedir mais?

O ano passado foi sem dúvida das minhas provas preferidas. Não só porque me correu muito bem, mas principalmente porque adorei o percurso, que é bem ao meu jeito. Gosto de subir durante muito tempo, gosto de recuperar em descidas longas e gosto, muito, de andar na montanha. E o Açor é montanha a sério.

Mais um post com a excelente contribuição fotográfica do Miguel Cadalso! Tenho que começar a fazer o meu calendário em função das provas que ele participa.
O fim de semana tinha tudo para correr bem. Pela primeira vez este ano conseguimos fazer uma viagem de família até uma prova. Saímos os 4 ao fim do dia rumo ao Inatel Piodão, para nos juntarmos aos companheiros do Grupo Desportivo da Parreira até domingo. A previsão era de tempo frio e seco, perfeito! No entanto, nas ultimas semanas andei sempre com a sensação que estava longe do meu melhor e como não abrandei a carga na semana anterior preparei-me para mais uma prova sofrida, como foram praticamente todas este ano.

Foto da meta tirada pela Sara da janela do nosso quarto no Inatel. Viu a partida sem ser preciso sair do quarto, luxo!
Este ano, ao contrário de todas as anteriores edições, a partida foi dada no centro da aldeia do Piodão, em vez de ser no Inatel. Foi essa a única diferença no percurso em relação ao ano passado, os 500m da descida e subida ao hotel. Olhei 360º à volta para as grandes montanhas que nos rodeavam, estávamos bem no fundo do vale. Percorri o percurso mentalmente uma ultima vez, lembrava-me bem quais os picos que subiriamos, para onde partiriamos e o caminho de regresso. Junto ao pórtico as caras conhecidas são mais que muitas. Últimos cumprimentos e fotografias e estávamos prontos para a viagem. Siga!



A partida foi dada e imediatamente entrámos no trilho que nos levaria até Chãs d'Égua, na base da primeira grande subida do Piodão Ultra Trail. Foram 5km tranquilos, num single muito bonito com pequenas subidas e descidas, ideal para meter o motor a funcionar antes de começarem os grandes desníveis da prova. 


O primeiro abastecimento (eram 7 no total!!) apareceu logo aos 5km, nesta aldeia. Não parei, estava com pouco mais que meia hora, mas aproveitei para armar os bastões e preparar-me para os 600m de desnível da primeira grande subida da prova. Primeiro em escadarias da aldeia e depois, a grande maioria, num estradão que zigue-zagueava pela encosta permitindo aliviar a inclinação em vários patamares. 

Não sendo fisicamente dotado e não treinando os volumes que outros treinam, tenho consciência que a gestão das provas e do meu esforço é dos maiores trunfos que tenho. Dificilmente me apanham em picanços ou a perseguir alguém que me passa. Ainda por cima pouco confiante como estava, a minha estratégia era simples: esta subida teria que envolver o mínimo de esforço possível, de forma a chegar lá acima incólume. Escusado será dizer que numa subida tão acessível como esta, e no início da prova, passaram dezenas de pessoas por mim! Escusado será também dizer que, apesar de não aumentar o passo para ir atrás, foram poucas as vezes que ao passarem por mim não pensei "espera lá que já te viro, ainda falta muito!" :)

Parte final do estradão da subida, foi só aqui que meti passo de corrida.
Parece ter resultado. Quando cheguei ao topo não estava minimamente cansado e ataquei os 5km de descida até Malhada Chã com alma. Um aspecto que acho perfeito nesta prova é que as descidas dão sempre para recuperar das subidas, apesar desta até ser das mais técnicas da prova. Um single espetacular numa encosta, com muita pedra e algumas pequenas subidas. Muito longa e variada, tive a sorte de andar quase sempre sem ninguém à frente ou atrás e pude meter o ritmo que era mais confortável para mim. Foi aqui que comecei a sentir que talvez fosse um bom dia.

Chegada a Malhada Chã
Malhada Chã é daquelas aldeias que só se vêem nos postais. É tudo perfeito! Bem no fundo do vale, do lado oposto da mesma montanha onde está o Piodão, com pequenas pontes e escadas de xisto. Era lá que estava o segundo, muito basto, abastecimento. Aqui já parei para beber uns copos de isotonico (gold drink, da gold nutrition) e umas fatias de presunto. Ultimamente tenho tomado mais atenção ao aspecto da reposição de sais. Não me apetece implementar a rotina de tomar uma cápsula de sais de hora a hora, já chega ter que me preocupar com a comida, mas em todos os abastecimentos meto alguns sais. Muitas vezes opto por banana com sal, que há em todas as provas, mas se há presunto como neste não hesito.

Da aldeia, lá bem de baixo, dá para ver o Picoto do Cebolo, ponto mais alto de toda a prova nos 1400m. Nova subida de 600m, esta com uma primeira metade bastante inclinada que depois desagua num estradão na cumeada que nos leva até Picoto. 

À saída de Malhada Chãs

Primeira parte da subida, no trilho mais técnico
Foi nesta primeira parte, a mais difícil, que realmente entrei na prova. Adoro este tipo de subida em que posso ir a tricotar de forma a encontrar o caminho que implique menos amplitude de movimentos. Apercebi-me que estava muito entusiasmado quando dei por mim a tagarelar com o Miguel, que já me respondia pouco eheh. 

Chegados ao estradão há um pequeno troço plano, antes do ataque final. Tal como no ano passado, as pernas respondem sem hesitar ao passo de corrida que imprimo. Está a correr bem, mas não me entusiasmo. Assim que inclina volto a andar com os bastões. Nesta altura, com a Estrela nas costas e acima dos 1000m, está um vento cortante muito frio.

Aqui ainda a correr, com o picoto lá ao fundo
Ops, já está a subir, toca a andar!
A partir daqui separei-me do Miguel, por isso as fotografias vão diminuir. Mas acho que já é seguro dizer que nunca tive um post com tantas! 

A segunda subida da prova foi conquistada mais uma vez sem grande esforço, agora seguia-se outra longa descida até Covanca. Lembrava-me bem desta parte no ano passado. Os dois primeiros quilómetros eram um estradão que, não sendo demasiado inclinado, permitia soltar completamente as pernas se assim o quiséssemos. Assim foi! Disparei para dois quilómetros muito rápidos antes de entrarmos numa parte mais inclinada e finalmente num trilho que nos levaria até à aldeia de Covanca, aos 25km, onde estava o terceiro abastecimento. 

Metade da prova estava feita e as sensações eram muito boas. Comi uma sopa de legumes e fiz-me ao caminho até à Fornea, próximo abastecimento. O caminho até lá é possivelmente das partes mais desinteressantes do percurso inteiro, com uma subida não muito grande no meio dos eucaliptos, depois uma secção intermédia em alcatrão e finalmente dois quilómetros em trilho que já acaba ligeiramente a subir até à Fornea. 

Cerca de 1km de alcatrão plano, até apanharmos o trilho
O que não é nada desinteressante é o abastecimento da Fornea. Se a subida seguinte é a mais conhecida do percurso, este abastecimento é daqueles que dão nome ao Mundo da Corrida. Um autentico banquete de casamento! Nesta altura ainda estava cheio com a sopa de Covanca, mas arranjei espaço para meia bifana, muito salgada, como se quer.

Como referi no parágrafo anterior, esta próxima subida é a mais temida do percurso. Curiosamente, desde que percebi que estava num bom dia, estava ansioso por a encontrar. Tal como aquela primeira parte da subida ao Picoto do Cebolo, toda ela é muito técnica e inclinada, não tão longa como as outras, mas mais trabalhosa. Meti o meu passinho certo e tricotei por ali acima com o entusiasmo em crescendo. Já perto do fim, com o motor a entrar em sobre aquecimento, começou a soprar uma brisa gelada que tratou de arrefecer para níveis confortáveis. Perfeito!

Parte final da subida, já menos inclinada mas com as mesmas pedras.
Virada a montanha, a vista é incrivel. 10km separam-nos do Culcurinho, ultimo pico do dia a conquistar, as eólicas instaladas na cumeada indicam-nos o caminho até lá. Mesmo por baixo de nós já se vê o Piodão, mas ainda há uma grande volta a dar antes de lá chegarmos. 

Aquele pico lá ao fundo é o Culcurinho.

Foi nesta altura que deixei de parte a estratégia conservadora e comecei a dar um bocado mais. Não que tivesse desatado a correr por todo o lado, mas já forçava muito mais do que até ali. Foi assim nos 10km de sobe e desce intermédios até ao ataque final ao Culcurinho, ultimo grande obstáculo da prova e onde o ano passado levei uma pequena marretada.


São apenas 300m de subida em estradão, mas facilmente apanham desprevenidos os mais incautos (como me apanhou a mim, o ano passado). Basicamente porque já ninguém conta com ela nesta altura. As três grandes subidas da prova, aquelas que saltam à vista no perfil, estavam ultrapassadas, era só mais um montículo antes da grande descida final! Nada mais errado, são 300 metros muito inclinados numa altura que já vamos com cerca de 2300d+ nas pernas, isto numa cota acima dos 1000m. Se não formos mentalizados para ela o homem da marreta espera por nós confortavelmente lá em cima na capela.

Início da subida, com a capela lá ao fundo no pico.
Parte final
Desta vez já não me apanhou desprevenido, mas confesso que vacilei um pouco aqui. Lá no topo estava o penúltimo abastecimento. Parei brevemente para beber isotónico e uns amendoins, o ano passado as cãimbras atacaram-me nesta ultima e longuíssima descida, não queria voltar a passar pelo mesmo.

São 7km e 800m de descida que nesta altura nos separam de Foz d'Égua. É muito raro apanhar descidas tão longas em Portugal e eu sei, por experiência própria, como elas podem ser perigosas. É muito mais fácil treinar subidas que descidas. Não há reforço muscular ou treino de propriecoiso (nem com a ajuda do Google consegui escrever esta palavra) que simulem a tareia que é para o corpo levar com uma grande descida deste género. Primeiro numa parte muito inclinada e com muita pedra, que nos obrigava a travar constantemente, depois num estradão infinito que zigue-zagueava e permitia meter velocidades mais altas e finalmente num trilho mais técnico, numa mistura explosiva para os quadricepes, que hoje estão bem doridos. Excelente!

Miguel, tive que ir ao Google buscar uma imagem da Foz d'Égua, estás a falhar!
Chegados ao Shire, perdão, a Foz d'Égua, estava à nossa espera o ultimo abastecimento da prova (recordo, de 7 (sete)). Apenas 3km separavam-nos do Piodão, num single que subia vagarosamente pela encosta, vale acima. Sentia-me na máxima força nesta altura e forcei bastante, sem nunca me sentir a quebrar.

Trilho de acesso ao Piodão. Pronto Miguel, estás perdoado.
A chegada ao Piodão foi pelo mesmo sítio do ano passado, com cerca de 500m a descer. A diferença é que desta vez ficámos por lá, em vez de subirmos os 500 metros até ao Inatel. Cortei a meta a sentir-me bem e muito satisfeito! 

Foto tirada pela mulher do Miguel. Vou contratar a família toda para o Quarenta e Dois!
Demorei 6h43, menos 5 minutos que o ano passado, mas se juntarmos o km que foi cortado o tempo seria ligeiramente superior ao anterior registo. Acreditem, não é da boca pra fora quando digo que o tempo foi o menos importante neste dia. Na verdade, considero que a minha prova foi perfeita! Foi uma das poucas vezes que sinto que venci a distancia de 50km, sem nunca quebrar, com uma gestão perfeita do esforço. Este ano raramente me senti assim. Desde os Abutres, quando comecei a desconfiar de tudo, que andava pouco confiante para o que aí vem (o MIUT). Era exactamente de uma prova destas que precisava para voltar a ganhar confiança.

À minha espera na meta estava o Vasco, do GDP. Juntos fizemos o que ficou a faltar: a subida ao Inatel. Não que tivessemos muita vontade mas..estávamos lá alojados :)

O dia continuou com um banho na piscina do Inatel com os miúdos, jantar no hotel com a família do GDP e no domingo ainda deu para passear pelo Piodão e ir até à Estrela ver a neve. Um fim de semana que só não foi MESMO perfeito por causa do Judas Pereira!

Jantar no Inatel. Grande grupo!

A nossa melhor tentativa de foto de família. Quase que os miúdos ficavam bem!

A Estrela ainda tinha muita neve. E o casaquinho vermelho de finisher do Circuito Endurance da ATRP? Ah pois é!
A três semanas de enfrentar mais uma vez o MIUT dificilmente poderia pedir um fim de semana melhor. Agora sim, estou confiante que o treino feito desde o início do ano não me deixará mal. Não quer dizer que a prova está no papo, se há corrida que não se dá com este tipo de sobranceria é o MIUT, mas sei que tenho o que é preciso. Segue-se uma semana ainda de carga com um longo mais suave e duas semanas a descer até ao grande dia. A ele!

2 comentários:

  1. Prova perfeita? O que se pode pedir mais?!?
    Muitos parabéns!!!
    E bom resto de preparação para o MIUT :)
    Um abraço

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  2. Fantástico.
    Acima de tudo conseguiste ganhar confiança para o MIUT, e desfrutas-te do Piodão.
    Bons treinos e boa prova no MIUT.

    Abraço

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