As minhas corridas na estrada

terça-feira, 12 de março de 2019

Proença Cross Trail (44km) - à morte.

Umas horas antes da partida confessei aos meus companheiros que, pela primeira vez nesta distancia, ia arriscar. A recuperação de Montemuro foi pacifica e tenho andado a treinar bem desde então, a ideia de ver até onde dava começou a formar-se lentamente nas ultimas semanas e foi com alguma ansiedade que cheguei a Proença no Sábado. Os anunciados 2500+ para 44km impunham respeito, mas depois de ter feito esta prova em 2014 e ter falado com alguns amigos sabia que o percurso seria pouco técnico e bastante "corrível", apesar do desnível muito alto. Tenho andado a sentir-me muito bem a subir e contava com as descidas para recuperar, fossem elas fáceis. Na realidade não foi bem assim, mas os dados estavam lançados. Como diz o Sommer, no trail há duas maneiras de correr: à morte ou a fugir da morte. Aquele era o meu dia de correr à morte.

Antes da partida, com algumas das minhas pessoas preferidas e companheiros do dia: Bastos, Cabeçudo, Ângelo e Rodrigo.
Ok. Calma. Quando soou a partida às 9 da manhã não desatei a correr a 3 ao km, à Tiago Godinho. O meu "à morte" basicamente foi tentar estender até ao limite o trote nas subidas, em vez de parar ao primeiro aperto, dar tudo nas descidas fáceis, meter o trote antes do final das subidas e correr sempre em plano. Ou seja, é um à morte muito mariquinhas, desculpem desapontar-vos. 

Foto da organização
Dez minutos depois da hora é dada a partida em Montes da Senhora, para onde fomos transportados de autocarro. Gosto sempre destas provas lineares, que não começam onde acabam. Dá mais a ideia de irmos a progredir no terreno. Estava eu a dizer, 9:10 é dada a partida e vejo-me mais ou menos entre os 20 primeiros, dos 90 que partiram. Como já perceberam, o meu à morte mariquinhas não me permitiu grandes veleidades, por isso os primeiros 5 ou 6km, mais planos ou a descer, foram feitos confortavelmente ali entre os 4 e os 5 ao km. Todas as, ainda, pequenas subidas eram feitas a trote sem grande esforço e os esperados estradões e trilhos fáceis permitiam um andamento muito constante. So far so good.

44km, 2500 D+, muito sobe e desce.
Quem já fez provas do antigo Território Circuito Centro, da Horizontes, sabia o que esperar. Provas pouco técnicas, com muito estradão, em locais interessantes. Apesar do percurso ser integralmente diferente do que fiz em 2014, a filosofia manteve-se. Cerca de 60 ou 70% de estradão e estrada florestal, trilho confortável no meio do pinhal e algum, pouco, trilho mais técnico. O nome, Proença Cross Trail, diz tudo! Mas esta prova tem um pormenor muito importante, o desnível positivo acumulado é enorme para a distancia. Por exemplo, tem tanto como o Zela e quase tanto como o Freita Sky Marathon, ambas provas de sky running, onde o desnível é rei. A diferença é que aqui chegamos lá por caminhos diferentes, mas os metros subidos ficam todos nas pernas na mesma. Outra particularidade que me deu alguma confiança para "arriscar" foi perceber que apesar do perfil dar a entender que é um constante parte pernas, as subidas tiveram sempre no mínimo 200+. Ou seja, eram longas o suficiente para não ficar com aquela impressão que detesto de nem perceber se estou a subir ou descer. 

Foto random da organização, para mostrar que também haviam trilhos.
A coisa seguia tranquila nos primeiros 11km, onde chegámos ainda com pouco desnível positivo. A única surpresa até foram algumas descidas bastante inclinadas que não davam de maneira nenhuma para repor energia, mas continuava a sentir-me muito solto e sempre com trote pronto nas pernas. O primeiro abastecimento de sólidos surgiu apenas aos 17km. Sim, é um pouco tarde, mas a informação existia, tínhamos que ir preparados. Na prova existiram apenas 3 abastecimentos de sólidos. Há quem ache pouco, mas sinceramente não acho um problema, até porque estavam os 3 mesmo muito completos. Há que fazer o trabalho de casa e preparar a alimentação para o tempo entre abastecimentos. Teria sido grave, sim, se estes fossem fracos. Mas não era o caso.

Foto da organização do Pedro Oliveira, no topo de um monte.
Esta zona do país tem uma particularidade. É montanhosa, mas não tem nenhuma montanha que seja muito proeminente. O que quer dizer que apesar de termos andado em cotas bastante elevadas (até 920m), nunca deu aquela ideia de estarmos muito altos, porque à nossa volta haviam várias montanhas com alturas parecidas.

Tal como o percurso, a minha corrida não teve grande história. O plano foi cumprido na perfeição, tive sempre pernas para no mínimo iniciar as subidas a trote e retomar antes do fim destas. Acabei por me salvaguardar em várias descidas que foram mais difíceis, mas dei tudo quando estas eram em estradão. Não tenho registo da frequência cardíaca, mas de certeza que foi bem mais alto do que o normal em provas desta distância. Comi e bebi bem nos abastecimentos e precavi-me para a desidratação provocada por um calor anormal para a altura. 

Este estradão marcava simultâneamente o ponto mais alto do percurso e o fim da ultima subida. A partir daqui eram 9km praticamente sempre a descer! Foto da organização.
Como disse no inicio, quando a prova começou vi-me nos primeiros 20. É engraçado que durante todo o percurso nunca fui ultrapassado, com excepção de algumas trocas de posição que ora passava ora era passado, e ultrapassei apenas 4 ou 5 pessoas, acabando em 15º, 5h37 depois. Mas a classificação pouco ou nada importa, já que a prova, apesar de ser do campeonato nacional de ultra trail, não tinha muita concorrência. O que me deixa realmente orgulhoso foi o risco que tomei ser totalmente compensado. Foi sem dúvida a prova na distancia ultra mais sólida que já fiz e deu uma pica brutal atirar o martelo nas descidas e ir no limite. Na parte final, já depois dos 40km, tenho alguns quilómetros entre os 4 e 5'/km. Nada de especial para quem normalmente anda na frente, mas deixou-me a mim muito satisfeito!

As medalhas eram bem giras. foto da organização.
Quanto à prova, é o que é e não tenta ser mais do que é. Isso, para mim, é positivo. Achei o percurso muito rolante mas com a dificuldade extra do desnível ser alto. No entanto não faltaram alguns bons trilhos, passagens em povoações (às vezes parecia que estávamos a invadir quintais) e paisagens bem bonitas. Obviamente que é uma prova onde dá para correr muito mais que numa prova de sky, mas há espaço (e gostos) para tudo. Quanto às marcações, são as típicas marcações da Horizontes. Não se espere que o percurso esteja sinalizado tipo pista de aterragem de aviões, as fitas são poucas mas estão sempre no sitio certo. Exige mais concentração, é verdade, mas eu até prefiro assim do que ter a papinha toda feita. Foi um dia muito bem passado com amigos e um belo treino para o MIUT, que está aí ao virar da esquina!


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