As minhas corridas na estrada

sexta-feira, 7 de fevereiro de 2014

A Maratona

Como disse no ultimo post, nunca fui um sedentário, sempre fiz desporto. Começou com a natação. Durante toda a minha adolescência treinei diariamente e muitas vezes duas vezes por dia (tão bom que era ir para a piscina às 6:30 da manhã antes das aulas..ui!). Entrei para a universidade e ainda me aguentei a treinar sozinho durante um ano, mas depois deixei-me embeber pelo "espírito académico", a.k.a. boa vida de quem se vê de repente a viver sozinho em Lisboa, e tive um ano de excessos em que praticamente não fiz desporto. De repente dei por mim uns 10kg mais gordo e numa forma miserável, nem me reconhecia! Nunca mais fiz desporto àquele nível, mas comecei a correr uma ou duas vezes por semana. Sem grandes objectivos lá ia correndo. Participei nalgumas meias maratonas (a primeira foi em 2004, na 25 de Abril em Lisboa, demorei mais de duas horas) e praticamente todos os anos corri os 20km de Almeirim, na minha terra. Nada de sério, às vezes estava uma semana ou duas sem correr, outras corria 3 vezes, o importante era sentir-me bem comigo mesmo. Até que em 2011 li um livro chamado "A Maratona de Nova Iorque". Era uma espécie de diário pessoal desportivo de um professor universitário que, como eu, corria muito ocasionalmente, até que um dia meteu na cabeça que queria correr uma maratona! Adorei ler os relatos dele e identifiquei-me imediatamente. Tinha um novo objectivo - A MARATONA! Nesse mesmo ano corri a maratona de Lisboa e foi...bem...como é que hei-de dizer...foi daqueles momentos em que sabes que a tua vida mudou e nunca mais vai ser a mesma! E de facto foi assim.

Infelizmente as palavras não me fluem naturalmente, por isso não esperem de mim um daqueles relatos super emotivos, mas a minha primeira maratona foi realmente especial, e não sei se foi da adrenalina ou se as endorfinas ainda me corriam no sangue mas no dia seguinte à corrida procurei o mail do Antonio Goucha Soares (autor do livro) na net e escrevi-lhe a agradecer-lhe pelo papel que teve naquele acontecimento tão importante. Ontem reli esse mail e, cum caraças, está lamechas como tudo! Ora vejam:

Caro António



Peço desde já desculpa por estar a ocupar o seu endereço de e-mail  profissional com uma mensagem pessoal, mas foi o único contacto que encontrei na net.

Tal como o António também eu era um corredor ocasional. Participei em algumas meias maratonas nos últimos 5 ou 6 anos, e corria 2 vezes por semana, sem qualquer objectivo a não ser o prazer que me dá correr e a satisfação inexplicável de terminar uma prova, mesmo que já não haja muita gente atrás de mim. Apesar de ter terminado 5 meias maratonas até ao início deste ano, a ideia de fazer uma maratona completa era completamente inatingível, até absurda na minha maneira de pensar. O esforço brutal que despendia para fazer uma meia fazia-me pensar nos maratonistas como super-homens, pessoas sobredotadas geneticamente que estavam um patamar acima de todos nós.

Em Agosto deste ano li o seu livro e mudou tudo. Percebi que está longe de ser uma questão genética, que passa mais por uma vontade férrea e disciplina que são impossíveis de explicar a alguém que não passe por isto. Os seus relatos emotivos de treinos e provas inspiraram-me a iniciar uma empreitada que se configuraria como um dos maiores desafios da minha vida.

Comecei a cumprir um plano de treino, muitas vezes sozinho, e fiz a meia da Vasco da Gama e de Almeirim. Fiz os treinos longos da praxe, corri à chuva, na lama, sozinho ou acompanhado, às vezes com vontade de desistir e ir descansar. Não desisti e este domingo lá estava no estádio do INATEL.. Estabeleci um tempo final objectivo, e preparei a corrida nesse sentido.

O que se passou nas 4 horas seguintes à partida foi descrito na perfeição no seu relato da maratona de Lisboa. Tive momentos em que senti que conseguia tudo, outros que me emocionei e até bati no mítico muro. No meu caso foi por volta do km 28, chegou mesmo a passar-me pela cabeça desistir. Já depois do esforço extremo da subida Terreiro do Paço – Areeiro, vi-me no km 40 e aqueles 12 minutos finais pareceram-me um objectivo impossível. Arrastei-me por mais 1km e meio sempre a suplicar pela próxima curva. Estava quase. Foi então que passei por si na Av. Dos EUA, a puxar por nós, que nos íamos a arrastar em sofrimento. Não sou religioso, mas aquele momento foi o mais próximo que tive de um clássico “isto só pode ser um sinal!”. Lá estava o homem que escreveu o livro que me inspirou a entrar nesta aventura de uma vida, a 700m da meta, a dar-me um último empurrão. Já estava. Deixei de sentir cansaço, dores, abri a passada e cumpri a distância final. Quando entrei no estádio parecia quase irreal, podia correr mais 20km assim. Lá estavam os meus companheiros de corrida e a minha família a puxar por mim.


É disto que me vou lembrar. Destes últimos 700m.

Escrevo-lhe este mail a agradecer-lhe por me fazer ver que estão dentro de nós as capacidades para cumprir qualquer objectivo. Depois de terminar a corrida todos os meus problemas mundanos foram relativizados. Estes 4 meses de treino e 4.07h de corrida tornaram-me uma pessoa nova, espero que mais gente tenha tido a sorte de ler o seu livro e, tal como eu, se tenham sentido inspirados a entrar nesta aventura.





Aqui está o livro. Aconselho todos a ler!



Chegada em Lisboa 2012, a primeira.



Barcelona 2012 - Com a minha mulher Sara.



Lisboa 2012, com o meu amigo Rodrigo Galão que se estreou na distancia. 



No Porto o ano passado, com o novo membro da família, a minha filha Maria Amélia :)



5 comentários:

  1. Tens razao...nao existe Maratona como a primeira. No Porto 2013 nao andamos muito longe um do outro :)
    Daqui a uns dias ja tens 5 no curriculo...forca nisso.
    Abraco

    * o teclado deste computador e alemao, os acentos andam algures por aqui mas eu nao os encontro :)

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  2. Ui... ler este artigo transportou-me para um ano depois nessa mesma Maratona, o dia em que me estreei na mítica distância. O final... a um quilómetro da meta, na placa 41, uma amiga aos pulos a apontar-me para a placa e a dizer que faltava só um. A minha reacção foi o mais sincera possível "Falta tanto!" Naquele momento, um quilómetro parecia uma outra Maratona. Mas quando entrei no estádio, uma imagem sonhada até à exaustão, estava leve, sentia-me a flutuar!

    Infelizmente, 10 meses depois, na Cascais-Lisboa, um inesperado e cruel problema forçou-me a retirar com apenas 15,5, daí a importância que terminar Sevilha tem para mim, e ler este artigo a 16 dias do grande dia, mexeu comigo como só quem anda lá dentro percebe.

    Um abraço e tudo a correr pelo melhor dia 23

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  3. Boas Filipe,

    Não somos assim tantos (maratonistas), e é sempre bom partilhar os momentos (bons e menos bons), quer para quem já tem uma ideia do que é, quer para quem um dia pensa passar por isso.
    Boa sorte dia 23, pelo menos deverá estar mais fresco do que na de Lisboa do ano passado, isso já ajuda.

    abraço

    Manuel Nunes

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  4. Já li esse livro. Tem uma escrita que aprecio, estilo diário. E facilmente nos sentimos parte dele, não é? Ou então dizemos: "olha, comigo também é/foi assim..."
    Tenho a certeza que dia 23 vai correr bem.
    Força Filipe!!

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  5. Olá Filipe,

    Domingo embarco eu nessa aventura pela primeira vez, como tal procurei por aqui alguma inspiração...e não é que encontrei :)
    È verdade, neste momento sinto um misto de sensações. Ansiedade da boa, ansiedade da tramada, expectativa...receio...
    Mas ao ler o teu artigo ganhei uma outra sensação, determinação!
    d
    Depois conto como foi o amasso :)

    Abraço

    Marco Jacinto

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